É provável que você tenha crescido com imagens de veículos voadores, seja em filmes como “Blade Runner” e “De Volta Para o Futuro” ou em desenhos como “Os Jetsons”. Nessas representações, alguns deles eram parecidos com os carros convencionais, enquanto outros eram menos usuais. Todos costumavam ser muito ágeis e versáteis, levando seus passageiros a qualquer destino muito mais rapidamente que as opções terrestres. Atualmente, estamos vendo esses veículos se tornarem realidade. E até mesmo com um novo detalhe: de forma totalmente autônoma.

Diversas empresas investem pesado nessa possibilidade. Um exemplo é a Kitty Hawk, fundada por Larry Page, cofundador do Google, e liderada por Sebastian Thrun, presidente da Udacity e pioneiro dos carros autônomos. A Kitty Hawk já possui protótipos em funcionamento, capazes de voar a uma altitude inicialmente limitada a cerca de 16 metros e a uma velocidade também limitada a 32 km/h.

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Companhias mais tradicionais também estão investindo nessa área, como a Rolls-Royce, que planeja ter um veículo em produção até o começo da próxima década contando com velocidade de até 400 km/h e autonomia de voo de 800 quilômetros.

No Brasil, a Embraer está começando a desenvolver seu próprio carro voador numa parceria com a Uber: a ideia é ter um veículo que atinja de 240 a 320 km/h a uma altitude de até cerca de 600 metros, com autonomia de 96 quilômetros.

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O investimento nesse setor se justifica, considerando o potencial disruptivo que esses veículos possuem. Basta observar qualquer grande capital brasileira para entender que precisamos de novas alternativas para a mobilidade urbana e que adicionar essa dimensão de locomoção pode fazer toda a diferença. Outro ponto muito importante é que esses veículos poderão ser utilizados até mesmo em áreas remotas, com estradas que apresentem dificuldades ou mesmo após catástrofes ambientais que danifiquem estradas.

Nada disso significa que a tarefa é simples e, para entender por que, é preciso dar um passo atrás para entender a tecnologia.

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 O que é um veículo autônomo?

Um veículo autônomo, voador ou não, é capaz de executar tarefas de maior ou menor importância para sua condução. Oficialmente, a SAE (Sociedade dos Engenheiros Automotivos) define que existem 5 níveis de veículos autônomos, que refletem o grau de independência deles e das tarefas executadas.

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São eles:

  1. Veículo com capacidade de realizar algumas tarefas de suporte, como controle de velocidade, mas sem participação significativa na segurança do motorista;

  2. Nesse nível, o veículo conta com um nível de automação parcial, que pode incluir frenagem, aceleração ou curvas automáticas. Ou seja, apesar se prover um auxílio ao motorista, ainda o mantém como o responsável pelo veículo a todo momento;

  3. No terceiro nível, o veículo já pode ser conduzido de forma autônoma quando algumas condições específicas são atendidas. Geralmente, essas condições se relacionam ao terreno e à velocidade do veículo. A maior desvantagem desse nível é que um motorista humano precisa estar sempre preparado para assumir o controle do veículo em qualquer situação problemática ou que fuja das condições especificadas para o funcionamento autônomo;

  4. Nesse nível, o veículo é capaz de se locomover de forma autônoma e segura na imensa maioria de cenários, com exceção de algumas situações muito incomuns, onde um humano se faz necessário;

  5. O último nível de automação é o sonho de consumo dos usuários e fabricantes. Nesse, o veículo é capaz de se locomover de forma completamente autônoma e segura em todas as situações possíveis.

Agora é preciso entender o que torna um veículo voador diferente de um terrestre — e o que isso muda na hora de programar sua autonomia. Fundamentalmente, é sua capacidade de aproveitar o eixo vertical (a altura) para se locomover. Essa dimensão adicional permite uma amplitude de movimento muito maior, capaz de evitar trânsito nas ruas e outros obstáculos.

Por outro lado, basta observar o que acontece com helicópteros para entendermos o tamanho do desafio dos carros voadores. Enquanto para dirigir um carro convencional é necessário apenas um treinamento simples, para dirigir um helicóptero a pessoa interessada precisa de um treinamento muito mais extenso e de muitas horas de voo acompanhado. Isso se deve à maior dificuldade de pilotar um helicóptero. Para carros voadores, essa dificuldade permanece, justificando que os fabricantes invistam em formas de facilitar o voo, garantindo que a dificuldade para o motorista seja menor ou igual a de pilotar um veículo terrestre. É por isso que os veículos voadores têm contado com um nível de automação significativo.

Uma subcategoria de veículos voadores cada vez mais relevante é a dos eVTOL (electric vertical takeoff and landing vehicle), que são veículos de decolagem e pouso verticais, assim como helicópteros. A grande vantagem, nesse caso, é que eles não exigem grandes pistas para executar esses movimento de início e fim de voo.

Oportunidades e desafios

Mesmo assim, há motivos para os veículos voadores terem demorado tanto tempo para ganhar impulso: os desafios associados são muito variados.

O comando de veículos com diversas hélices pode ser bastante problemático, uma vez que exige um bom sistema de apoio computadorizado e forte propulsão para que possa voar em segurança. Há também outros aspectos práticos a serem considerados na hora de criar o design, como vento, chuva e prédios: manter-se no ar em circunstâncias dinâmicas exige alta tecnologia e peças pesadas.

Lidar com esses problemas é cada vez mais possível devido aos novos materiais estruturais desenvolvidos, que aliam resistência mecânica com leveza. Motores elétricos também estão ainda mais potentes, leves e confiáveis, colaborando para a composição final do conjunto. Outro ponto que tem evoluído muito é o de baterias, que estão muito menos pesadas e possuem maior capacidade de carga.

Além dos desafios técnicos, naturalmente existem desafios de segurança, já que hélices rodando em altas velocidades podem facilmente causar acidentes. Adicionalmente, toda a regulamentação de trânsito precisa ser revista, já que esses veículos possuem um comportamento muito diferente tanto de carros quanto de aviões e helicópteros. Para contornar os possíveis entraves, algumas empresas estão fabricando protótipos que possam ser considerados ultraleves, encarando assim regras mais brandas.

Outro grande desafio é o ruído. Basta observar um pequeno drone portando uma câmera para perceber o potencial que veículos voadores possuem para gerar ruídos perturbadores — imagine isso na escala de um carro. Cabe aos fabricantes e empreendedores chegar em soluções que mitiguem tais emissões sonoras ou então que ao menos as tornem aceitáveis para um ambiente urbano.

Em suma, o interesse no setor é crescente e as inovações são empolgantes. O primeiro veículo voador comercial foi lançado no salão do automóvel de Genebra em março de 2018. Fabricado pela montadora PAL-V, o Liberty é capaz de atingir 180 km/h ao longo de um voo, com autonomia entre 350 e 500 km com um tanque de gasolina. Atualmente, a empresa está vendendo um lote limitado de 90 unidades por 499.999 euros.

Mas levará algum tempo até vermos carros voadores comerciais efetivamente disponíveis para o público geral. No entanto, quando enfim chegarem, possivelmente na próxima década, seu impacto será muito relevante — o que torna este um ótimo campo de trabalho para pessoas que desejem participar dessa revolução.