Todo ano é a mesma coisa: quando se aproxima a Black Friday, as lojas virtuais procuram se preparar para a demanda esperada. Em geral, isso significa adequar a infraestrutura de tecnologia para que não haja falhas na experiência de compra.
Existe uma parcela da população, entretanto, que segue sem atendimento adequado — e não necessariamente por insuficiência de servidores. São as pessoas com deficiência (PCDs), que encontram dificuldades tanto no momento da compra quanto quando precisam de atendimento posterior.
De acordo com o Censo de 2010, que está em vigor atualmente, elas são 45 milhões de brasileiros. Em pesquisa feita pelo Grupo Croma, a Oldiversity, 88% dos 1814 entrevistados dizem que as lojas não estão preparadas para atendê-los. Além disso, 70% deles afirmam que o atendimento de vendedores e call centers ainda é inadequado para esse público.
Segundo 70% dos participantes, o planejamento das lojas para recebê-los deveria ser um tema prioritário. Eles sugerem, ainda, que haja mais lançamento de produtos e serviços (65%), propagandas apropriadas (62%) e contratação de profissionais que representem o grupo (55%).
Segundo Edmar Bulla, CEO do Grupo Croma, os desejos desse público dificilmente são atendidos porque a maioria das empresas não enxerga esse mercado como potencial. “Infelizmente, a sociedade tende a estigmatizar as pessoas com deficiência. Falta empatia e poucas marcas põem em prática ações inclusivas para esse público.”
Lei não é totalmente cumprida
O art. 63 da Lei Brasileira de Inclusão (LBI) determina que todos os sites de empresas com representação no Brasil sejam acessíveis às PCDs, mas a realidade é que isso não está implementado completamente na internet nacional. É o que demonstra outro levantamento, feito pela BigData Corp para o Movimento Web para Todos.
Os pesquisadores visitaram 14 milhões de endereços ativos da internet brasileira para avaliar seu nível de acessibilidade. E a conclusão é desanimadora: menos de 1% deles passaram em todos os testes. Nos sites governamentais, é ainda pior: o percentual cai para 0,34%. E ainda há os 5,6% de sites ativos que falharam em todos os testes.
A maioria dos endereços online do país (93,79%) fracassa em alguns aspectos, mas vai bem em outros. “Não é porque um site falhou em um teste específico que uma PCD não possa usá-lo. O que ocorre é que a experiência de navegação será ruim”, pondera Thoran Rodrigues, presidente e fundador da BigData Corp.
Foram observados, ainda, itens técnicos, como erros em formulários, links, imagens e frames (como vídeos de canais do YouTube). Para as validações, foi usado o validador de markup (HTML) automático do World Wide Web Consortium (W3C).
Simone Freire, idealizadora do Movimento Web para Todos, diz que esse resultado reflete o ciclo de invisibilidade de décadas dessa população. “Isso não se sustenta mais: essas pessoas querem e têm o direito de se informar, se relacionar, se divertir e comprar online”, reforça.
Segundo ela, a adequação dos sites é benéfica para as empresas, já que tornar as páginas acessíveis é excelente para os negócios. “Assim, as companhias têm a chance de interagir com um público consumidor que ainda não foi captado no mundo digital.”
Rodrigues destaca que, apesar de os sites serem muito visuais, existem ferramentas de desenvolvimento que permitem que qualquer página seja mais acessível. Para ele, a depender do porte do site, pode ser mais vantajoso elaborar outro, que já seja adaptado, em vez de tentar fazer a adequação.
Características importantes para a acessibilidade
A acessibilidade de um site começa no desenvolvimento do código. Isso porque as tecnologias assistivas têm de ser implementadas adequadamente para que funcionem na página. “Algumas PCDs precisam navegar pelas setas do teclado, pois não conseguem usar o mouse, por exemplo”, lembra Simone. “É preciso, então, que a página permita isso.”
O desenho do site também deve considerar as necessidades das PCDs. É preciso que haja contraste de cores, que seja possível mudar o tamanho da fonte e que a exibição do texto seja adequada. “Aqui no Brasil, por exemplo, lemos da esquerda para a direita. Quando o texto está centralizado ou justificado, quem tem deficiência cognitiva encontra dificuldades.”
Quando o assunto é conteúdo, é fundamental que haja descrição nas imagens para que deficientes visuais saibam do que se trata. “Sem isso, o leitor de tela lê o nome dado à ilustração”, explica Simone. “Em um site de e-commerce, isso inviabiliza a compra, já que o consumidor não sabe o que é o produto.”
Outro aspecto importante, especialmente em texto, é evitar metáforas. Há hoje no país cerca de 10 milhões de cidadãos com algum tipo de deficiência auditiva e se comunicam pela linguagem brasileira de sinais (libras). Os sistemas que fazem a interpretação de texto em libras são prejudicados quando há muitas metáforas ou textos escritos em ordem invertida.
Felizmente, em sites novos é bastante comum que o código seja desenvolvido de forma adequada. “Isso porque as regras de otimização, que permitem que o site ganhe mais relevância, já incluem esses parâmetros”, completa Simone.
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