Garry Kasparov: ‘É preciso perder o temor às novas tecnologias’

Redação05/12/2017 13h35

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Ao ser derrotado pelo computador IBM Deep Blue, em 1997, o russo Garry Kasparov poderia ter engrossado o insistente coro contra os robôs e computadores inteligentes. No entanto, o ex-campeão mundial de xadrez defende que as pessoas devem aproveitar o potencial das máquinas ao invés de teme-las. Em passagem pelo Brasil, Kasparov compartilhou sua visão sobre os benefícios e riscos que a computação cognitiva tende a oferecer.

Medo do Novo

Tida por especialistas como uma nova revolução industrial, a computação cognitiva tem enfrentado resistência quando o assunto é mercado de trabalho. De fato, a inteligência artificial começa a chegar a diversas áreas com forte mão-de-obra humana, como atendimento ao consumidor, advocacia e transporte privado. No entanto, Garry Kasparov acredita que é necessário superar o temor às novidades.

“Por um lado, você não quer ser superado por máquinas inteligentes. Mas, por outro lado, as pessoas devem compreender que há muitas coisas que eles [os robôs] fazem melhor. Eu acho que, de certa forma, o problema é psicológico, pois nós sempre tratamos novas tecnologias com muita suspeita”, argumenta o ex-campeão de xadrez.

Tal resistência, segundo Kasparov, poderia ser percebida na forma como a imprensa e a população tratam tecnologias como carros autônomos. “Se temos um acidente com um veículo inteligente, isso estará na primeira página do jornal, ignorando o fato que [o número de colisões] é um em 1000”, disse o russo. O ex-campeão de xadrez acredita que, em 25 anos, as novas gerações olharão espantadas para o temor atual, uma vez que a direção humana já é mais perigosa do que a inteligência artificial.

A discussão sobre a automação de postos de trabalho, inclusive, já envolveu outros grandes nomes da indústria da tecnologia como Bill Gates. No início do ano, o fundador da Microsoft defendeu a criação de um imposto para robôs ou até mesmo a desaceleração no ritmo de automação das empresas.

Embora concorde com criação de uma taxa para auxiliar os trabalhadores que não se adaptarem à nova realidade, Garry Kasparov acredita ser mais nocivo impedir o desenvolvimento da tecnologia cognitiva. Em apresentação no Watson Summit Brasil 2017, o ex-campeão de xadrez defendeu que os benefícios só aparecerão quando governos e a população pararem de criar barreiras à inteligência artificial.

Mudanças na educação

Enquanto o mercado do trabalho passa por grandes transformações, a educação segue um caminho mais conservador e com poucas mudanças ao longo das décadas. Para Garry Kasparov, as escolas precisam se adaptar para um novo mundo interativo, incompatível com a figura do professor como “centro do universo”. “Se você colocar uma pessoa de 1880 em uma máquina do tempo, ela não reconhecerá nada, exceto as salas de aula”, disse.

No que diz respeito à preparação para o mercado de trabalho, Kasparov acredita que há um descompasso entre o que é ensinado em sala de aula e o que será encontrado fora delas. Atualmente, diversas empresas e pessoas influentes do mundo da tecnologia defendem a inclusão de novas disciplinas no currículo dos alunos, especialmente o ensino de linguagem de programação.

“Olhe para os postos que são populares hoje, como engenheiro de impressão 3D, operador de drone e gerente de mídias sociais, eles não existiam há 15 anos. Ou seja, isso significa que em 10 ou 15 anos haverá outros trabalhos. E nós continuamos ensinando às nossas crianças algo que eles podem facilmente obter em computadores”, argumenta Kasparov.

Os verdadeiros riscos da inteligência artificial

Além das empresas, a computação cognitiva tem desperto interesse de expoentes e também de governos ao redor do mundo. Em setembro, o presidente russo Vladmir Putin declarou que a nação que dominar a inteligência artificial será a nova superpotência do mundo. A declaração, inclusive, foi comentada pelo empresário Elon Musk que acredita que a IA pode causar a Terceira Guerra Mundial.

Sobre o uso da inteligência artificial, Garry Kasparov não acredita que uma única nação pode controlar tudo em um mundo conectado e com rápida troca de informações. No entanto, o ativista, forte opositor ao governo Putin, acredita que é preciso fiscalizar para que a inteligência artificial seja usada para propostas positivas.

“Para os Putins deste mundo, é outra arma. Então, nós não temos outra chance a não ser seguir adiante e certificar que a inteligência artificial servirá para propostas criativas e construtivas”, disse Kasparov.

O ativista acredita ainda na força dos governos democráticos para evitar um possível cenário catastrófico como uma Terceira Guerra Mundial e que a criação de um cenário de temor e caos só interessa líderes totalitários como tática para se manter no poder. “As guerras foram causadas no passado pelos desafios de poderes ditatoriais e impérios que tentaram conquistar o mundo. Democracias nunca lutaram entre si. Enquanto o mundo livre manter a superioridade econômica e militar, eu não vejo quem pode começar uma guerra”, concluiu.

Colaboração para o Olhar Digital

Redação é colaboração para o olhar digital no Olhar Digital