Agências espaciais e até mesmo empresas privadas, como a SpaceX, de Elon Musk, já planejam realizar viagens tripuladas de longa distância para a Lua e Marte. O programa Artemis, da Nasa, por exemplo, espera enviar astronautas ao satélite terrestre até 2024.

No entanto, segundo Iain Boyd, professor de engenharia aeroespacial da University of Colorado Boulder, na Califórnia (EUA), todas essas ambições ainda precisam superar um desafio essencial: a consolidação da tecnologia de foguetes com propulsão nuclear.

Boyd diz ainda que a propulsão nuclear é fundamental para garantir missões mais eficientes e seguras para os astronautas. Isso deve-se, sobretudo, ao ganho de velocidade proporcionado às espaçonaves equipadas com o recurso.

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CEO da SpaceX, Elon Musk, já apresentou planos de levar até 1 milhão de pessoas a Marte até 2050. Imagem: Reprodução

Como explica o pesquisador, o primeiro passo de uma missão espacial envolve o uso de foguetes para lançar a cápsula tripulada à órbita. Hoje, a maioria dos equipamentos funcionam a base da combustão de componentes químicos. Para a espaçonave superar a gravidade terrestre e atingir destinos no espaço profundo, como Marte e a Lua, ela precisa adquirir velocidades enormes, que, segundo ele, muitos dos motores químicos podem não ser capazes de propiciar.

Uma espaçonave mais veloz também reduziria a duração das missões. Os astronautas em uma viagem a Marte, por exemplo, seriam expostos a níveis muito altos de radiação que podem causar sérios problemas de saúde a longo prazo, como câncer e esterilidade. Com a possibilidade de chegar ao destino mais rapidamente, a exposição da tripulação diminui.

Densidade energética

Mas afinal, porque sistemas nucleares são mais rápidos que foguetes de combustão química?

De acordo com Boyd, existem três pontos a se considerar ao comparar dois sistemas de propulsão: O impulso, isto é, o quão rápido o sistema pode acelerar a nave; a eficiência de massa, ou seja, o impulso que a tecnologia pode produzir conforme o volume de combustível carregado; e a densidade energética, o que corresponde à quantidade de energia que um determinado volume de combustível pode produzir.

Segundo o professor, os sistemas de propulsão químicos fornecem impulsos poderosos, porém os foguetes são particularmente ineficientes e não entregam um volume suficiente de densidade energética. Ele cita como exemplo o foguete Saturn V, que levou astronautas norte-americanos à Lua na missão Apollo.

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O foguete Saturn V antes de lançamento da missão Apollo 17, em dezembro de 1972. Imagem: Domínio Público

O equipamento produziu uma força de 35 milhões de newtons durante a decolagem e transportou 950.000 galões de combustível. A maior parte do combustível, no entanto, foi usada para colocar o foguete em órbita, o que revela uma limitação importante: “é preciso muito combustível pesado para chegar a algum lugar”, diz o Boyd.

Alternativa comumente empregada em satélites, foguetes de propulsão elétrica geram impulso a partir da eletricidade transformada por meio de painéis solares. Segundo Boyd, o sistema apresenta eficiência de massa cinco vezes maior que os sistemas químicos. Por outro lado, a tecnologia produz muito menos impulsão. Além disso, embora a fonte de energia solar seja infinita, os painéis tornam-se menos eficientes conforme a distância do Sol aumenta.

Reatores nucleares

Já os foguetes movidos por energia nuclear são promissores porque entregam mais densidade energética e podem gerar forças de impulso até duas vezes superiores aos sistemas químicos. Atualmente, engenheiros já desenvolveram dois tipos de propulsores nucleares para viagens espaciais.

Os motores de propulsão térmica usam um pequeno reator de fissão nuclear – semelhante a equipamentos aplicados em submarinos nucleares – para aquecer um gás, como o hidrogênio. Esse gás é acelerado através de um bico de foguete para fornecer força de impulso. Segundo Boyd, o sistema apresenta mais que o dobro da eficiência dos foguetes de propulsão química – ou seja, eles geram o dobro do impulso usando a mesma quantidade de massa propulsora.

Eles ainda podem fornecer uma força de até 100 mil newtons, o suficiente para acelerar um carro de 0 a 100 km/h em cerca de um quarto de segundo. Engenheiros da Nasa estimam que uma missão a Marte movida por propulsão térmica nuclear seria de 20% a 25% mais curta do que uma viagem com um foguete movido com componentes químicos, diz o professor.

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Foguete termal nuclear construído pela Nasa em 1967. Imagem: Nasa/Wikipedia

A outra tecnologia corresponde aos sistemas de propulsão nuclear elétricos. Por enquanto, nenhum sistema dessa espécie foi construído, mas a ideia é usar um reator de fissão de alta potência para gerar eletricidade que, então, seria distribuída em um sistema de propulsão elétrica. De acordo com Boyd, o sistema seria cerca de três vezes mais eficiente que a tecnologia térmica nuclear. Isso porque muitos propulsores elétricos individuais poderiam ser operados simultaneamente para gerar uma boa força de impulsão.

Em termos gerais, os foguetes nucleares também apresentam uma densidade energética muito superior aos motores de combustão química. O urânio usado nos reatores possui densidade energética 4 milhões de vezes maior que a hidrazina, um componente típico de propulsores químicos. “É muito mais fácil transportar uma pequena quantidade urânio ao espaço do que centenas de milhares de galões de combustível”, concluiu o professor.

Burocracia

Apesar das viagens de longa-distância representarem um desafio imediato, os sistemas termais de propulsão nuclear são estudados desde 1960. Segundo Boyd, normas regulatórias e a burocracia imposta por elas configuram um empecilho histórico no desenvolvimento da tecnologia.

“Os regulamentos impostos pela primeira vez nos EUA na década de 1970 exigiram essencialmente o exame e a aprovação caso a caso de qualquer projeto de espaço nuclear de várias agências governamentais e a aprovação explícita do presidente. Juntamente com a falta de financiamento para pesquisas em sistemas de foguetes nucleares, esse ambiente impediu melhorias adicionais nos reatores nucleares para uso em missões espaciais”, escreveu o professor, no artigo ao The Conversation.

Ele afirma, entretanto, que um memorando presidencial assinado em agosto de 2019 está mudando esse panorama. O documento permitiu que missões nucleares com quantidades reduzidas de material radioativo ignorem o processo de aprovação de várias agências reguladoras. Agora, as iniciativas precisam obter apenas a certificação da agência patrocinadora da missão de que o projeto atende à recomendações mínimas de segurança.

Boyd lembrar, por outro lado, que as grandes missões nucleares ainda estão submissas às regras antigas.

Fonte: The Next Web via The Conversation