É uma tremenda distorção pensar que inovar seja criar aplicativos. E um grave risco para nossos jovens que, loucos para construir um mundo novo, buscam inspiração apenas nos “Mark Zuckerbergs” que estão por aí. Há uma inteira outra parte do mundo da inovação a explorar, e precisamos que nossos talentos coloquem foco nela. Mal comparando, refiro-me à parte sólida da inovação, que pode ser representada pelos “Elon Musks”. Os membros dessa linhagem de inovadores concebem veículos movidos a energias renováveis, novas máquinas e equipamentos, dispositivos sofisticados, soluções de mobilidade, carros voadores e pesquisa, muita pesquisa, em novos materiais e compósitos. Há ainda a robótica, os humanoides e a automação. Sem falar na poderosa inovação em novas moléculas de medicamentos, na bioengenharia e biossegurança.
De fato, andamos o dia todo com um supercomputador na mão (é assim que nosso smartphone seria classificado trinta anos atrás), e isso pode levar as pessoas a acreditar que tudo o que é inovação passa por esses aparelhos. Que o conceito de digital, a inovação das organizações vanguardistas e o modus operandi das startups devem concentrar-se nessas telinhas, tornando secundários os robustos programas de pesquisa e desenvolvimento. Estes pareceriam menos interessantes para jovens engenheiros que sonham apenas em transformar ideias em soluções à mão.
Há 20 anos nós, engenheiros experientes, fazíamos palestras nas escolas de engenharia para convencer os jovens engenheiros a trabalharem… com engenharia. Pedíamos que não se deixassem seduzir pelo dinheiro e pela carreira oferecidos pelos bancos que, espertamente, sabiam o valor de um engenheiro. De maneira análoga, agora temos que reciclar os conteúdos dessas palestras e partir em uma cruzada para mostrar aos jovens engenheiros formandos de hoje que há um futuro atraente na outra metade da inovação.
Nem todos sabem, mas Elon Musk, símbolo dessa inovação concreta, escolheu o Brasil e está cavando túneis em Minas Gerais. Isso mesmo. Depois de fazer vingar carros elétricos e autônomos, foguetes e missões espaciais, uma das empresas desse mestre da inovação, a Hyperloop Transportation Technologies, com cerca de 800 engenheiros, desenvolve sistemas de transporte de passageiros e cargas usando cápsulas que voam à velocidade do som. Túneis de vácuo ligarão cidades e será possível deslocar-se a mais de 1000 quilômetros por hora. Belo Horizonte-São Paulo em trinta minutos, ou BR-381 sem caminhões. Tudo isso movido a energia solar.
Há muito mais inovação concreta no Brasil. Os incrédulos experimentariam um choque de realidade no que se refere a inovação e engenharia se fossem conhecer mais de perto o Centro Tecnológico da Marinha em Iperó, onde funcionam o Aramar e o projeto do Submarino Nuclear Brasileiro. Também se surpreenderiam com a Amazul – Amazônia Azul Tecnologias de Defesa S.A. É impressionante. Em contato com esses projetos, sentimos algo que andou em falta ultimamente: o orgulho da engenharia e da inovação brasileiras. Meu coração e o de qualquer outro engenheiro batem mais forte diante do que os cerca de 1200 profissionais têm sido capazes de realizar no programa nuclear da marinha, no programa nuclear brasileiro e no desenvolvimento do submarino a propulsão nuclear, que tem o objetivo de proteger as imensuráveis riquezas do nosso território marítimo. A Amazul, por exemplo, contrata 100% dos engenheiros navais que se formam no Brasil. Até o nome é sugestivo, já que o Brasil possui uma zona econômica exclusiva (ZEE) – áreas marítimas estratégicas de cada país – de aproximadamente quatro milhões de quilômetros quadrados, maior do que a superfície da floresta amazônica.
A conclusão é que não há fronteiras a separar a inovação “dura” da inovação dos apps; a epifania, a explosão de inovação, surge justamente quando se consegue compô-las harmonicamente, por mais diferentes que sejam os métodos e a forma de atingir cada uma delas. Portanto, a recomendação de pensar fora da caixa vale também para os inovadores.