Fusão de ministérios atrapalha avanço tecnológico do Brasil, dizem cientistas

Redação10/06/2016 20h35, atualizada em 10/06/2016 21h02

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Indicado pelo presidente interino Michel Temer, o ministro Gilberto Kassab (PSD) não terá dias tranquilos à frente do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações. Pesquisadores brasileiros criticam a fusão dos dois ministérios (Ciência e Tecnologia com o das Comunicações). Os protestos contra o seu trabalho já chegaram às ruas.

As marchas que criticam o corte de investimentos da área e contra a fusão ministerial começaram em Recife, mas devem chegar em outras cidades do Brasil, tais como Rio de Janeiro, Porto Alegre, Brasília, Belo Horizonte, Belém e Petrópolis.

De acordo com Sergio Rezende, cientista da Universidade Federal de Pernambuco em entrevista à Nature, “o governo sinaliza que a ciência não é importante e deve continuar assim”. Além de físico, ele também foi ministro da Ciência e Tecnologia entre 2005 e 2010.

Dessa forma, as manifestações pedem que o principal órgão controlador do avanço científico no Brasil volte a ter poder para atuar no país. Entre os cartazes, um deles ironizava o presidente interino ao afirmar, ao lado de uma foto de Temer, que “sem ciência não há Viagra”. Outros pediam a volta do MCTI e afirmavam até que o mosquito da dengue estava feliz com as mudanças.

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Trocas constantes

Em entrevista ao Olhar Digital, o presidente da Academia Brasileira de Ciência, Luiz Davidovich, afirma que as constantes trocas na chefia do órgão influenciam negativamente no avanço tecnológico brasileiro. “Temos uma grande quantidade de institutos tecnológicos que dependem das ações do ministério. É importante que o ministro entenda o trabalho do ministério e esse processo leva tempo”, afirma.

Para entender melhor, a entidade foi comandada por três pessoas diferentes nos últimos 16 meses. Aldo Rebelo (PCdoB), que já havia sido ministro do Esporte e ainda ocupou posteriormente o cargo mais alto do ministério da Defesa, foi nomeado ministro pela presidente afastada Dilma Rousseff no começo de 2015. Em 2 de outubro do ano passado, Celso Pansera (PMDB) assumiu o cargo até 14 de abril de 2016, quando a interina Emília Maria Silva tomou posse. Agora, a responsabilidade de organizar as ações ligadas aos campos científicos, tecnológicos e de telecomunicações cabe ao ex-prefeito de São Paulo e ex-ministro das Cidades.

As alterações frequentes no comando indicam que o cargo é considerado uma das maiores moedas de troca para agradar aliados. Outros nomes notáveis que já ocuparam a cadeira são Eduardo Campos, ex-candidato à presidência falecido em acidente aéreo em 2014, e Aloízio Mercadante, um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT).

De acordo com Davidovich, no entanto, “o ministério foi rebaixado”. “Tinhamos acesso direto a presidência e agora isso não vai mais acontecer”. Ele ainda afirma que está preocupado com a grande diferença entre os assuntos de telecomunicações e de ciência e tecnologia. O temor é que os assuntos ligados ao desenvolvimento científico percam espaço.

Sobre o nome de Kassab, o cientista prefere não opinar, mas diz que o conhecimento científico não é um “item obrigatório” para determinar a competência de um ministro da área. O mais importante, para ele, é que exista bastante diálogo com a comunidade científica. “O (Renato) Archer, o (Aldo) Rebelo e o (Celso) Pansera não eram da área científica, mas fizeram um bom trabalho com o que podiam”, diz.

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A expressão “com o que podiam” do profissional que também é físico e professor do Instituto de Físicada Universidade Federal do Rio de Janeiro refere-se a outro problema grave enfrentado por quem quer atuar com ciência no Brasil.

Investimentos escassos

Ao avaliar o trabalho recente realizado pelo ministério, Davidovich o resume em uma palavra: “Frustrante”. Segundo ele, é essencial que o financiamento seja maior. Atualmente o Brasil destina 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) ao setor e existe uma proposta para que o valor seja reajustado até 2020 para 2%. “Para efeito de comparação, na China, o investimento é de 2,5% e na Coreia do Sul, ele chega a ser maior do que 4%”, afirma.

Com isso, a possibilidade de o Brasil reagir a epidemias diminui, principalmente em uma época que o Brasil enfrenta problemas graves na área da saúde, com cada vez mais pacientes contraindo os vírus da Zika e da Chikungunya.

Além disso, outro problema criado pelos poucos investimentos em ciência é a dependência do Brasil em comprar produtos importados por não possuir a tecnologia necessária para produzi-los no Brasil de forma mais barata. Até mesmo o próprio setor econômico é afetado por isso. “O Brasil não vai para a frente se não diversificar as exportações. Outros países já fazem isso. O aumento da produtividade da agricultura, por exemplo, está ligado com a tecnologia”, explica.

Nossa reportagem tentou o contato com o ministro Gilberto Kassab durante diversas semanas, mas a assessoria do político afirmou que ele está com a agenda lotada e indisponível para entrevistas.

Colaboração para o Olhar Digital

Redação é colaboração para o olhar digital no Olhar Digital